Medições mostram que a montanha vem crescendo, o que sugere que o vulcão, cuja última erupção ocorreu há mais de 300 mil anos está inflando gradualmente
Foto: The New York Times
Cientistas: novo supervulcão pode se desenvolver na Bolívia
21 de fevereiro de 2012
A colina extensa na base do vulcão Uturuncu, na Bolívia, é discreta. A sua curva suave desaparece naturalmente na paisagem dos Andes. A extensão de 69 quilômetros de solo rochoso, porém, agora é objeto de fascínio científico internacional. Medições por satélite mostram que a montanha vem crescendo mais de 1,3 centímetro ao ano há quase 20 anos, o que sugere que o vulcão, cuja última erupção ocorreu há mais de 300 mil anos, está inflando gradualmente.
"O tamanho e a longevidade da elevação são sem precedentes", afirmou Shanaka de Silva, geólogo da Universidade do Estado do Oregon, que estuda o Uturuncu desde 2006. Considerado em conjunto com outras pesquisas recentes, prosseguiu de Silva, o inchaço significa que "é possível que estejamos testemunhando o desenvolvimento de um novo supervulcão".
A erupção de um vulcão desse tipo poderia expelir cinzas, rochas e pedra-pomes com força mil vezes maior que a erupção, em 1980, do Monte Santa Helena, no estado de Washington - o pior evento vulcânico da história recente dos Estados Unidos - e dez mil vezes maior que as erupções ocorridas em 2010 na Islândia, que paralisaram por semanas o tráfego aéreo internacional.
Felizmente, embora nosso planeta possua de 30 a 40 supervulcões - 10 deles potencialmente ativos - as supererupções ocorrem somente a cada 100 mil anos aproximadamente. Acredita-se que a última supererupção envolvendo o vulcão Toba, na ilha de Sumatra, 74 mil anos atrás, teria expelido cinzas em quantidade suficiente para causar um "inverno vulcânico", com duração de 6 a 10 anos, produzido um período de resfriamento global de 1.000 anos, e uma perda de vidas tão grande que o evento pode ter mudado o curso da evolução humana.
"Não vemos evidência da erupção iminente de um supervulcão em nenhum local da Terra", afirmou Jacob B. Lowenstern, geólogo e geoquímico pesquisador do Serviço Geológico dos Estados Unidos, especialista em um dos mais conhecidos supervulcões do mundo: o Yellowstone, no estado de Wyoming.
Em relação ao Uturuncu, Lowenstern afirmou que, embora "a elevação ocorrida em 20 anos seja certamente significativa", não há evidências suficientes para chamá-lo de supervulcão em formação.
Outros pesquisadores concordam. Contudo, o inchamento gradual do Uturuncu o torna um terreno fértil para estudos. "É como um tumor que cresce dentro da Terra", afirmou de Silva, "e temos que compreender se é benigno ou maligno".
Com capital da Fundação Nacional de Ciência dos Estados Unidos, uma equipe internacional formada por sismólogos, geólogos e geofísicos, além de outros especialistas e estudantes, criou em 2009 o projeto chamado Plutons para estudar o Uturuncu e o Lazufre, vulcão que fica na fronteira entre Chile e Argentina. (O nome do projeto é um sigla para os nomes dos vulcões e das instituições dos pesquisadores).
O Uturuncu já era considerado potencialmente ativo. No topo do declive de 2.400 metros (o cume fica 6 mil metros acima do nível do mar), pequenos orifícios no solo, chamados de fumarolas, liberam gases sulfúricos abrasadores. É possível que eles datem de 10 mil anos atrás, e são indícios da existência de uma fonte de calor próxima da superfície.
Também notável é o solo de cor branca próximo à cratera (que à distância se parece enganosamente com neve), consequência das mudanças térmicas que ocorrem abaixo. Geógrafo da Universidade de Alberta, no Canadá, e membro do projeto, Martyn Unsworth estudou os dados de um trabalho de campo de 20 dias, realizado em novembro com o uso do método magnetotelúrico de detecção de ondas eletromagnéticas, semelhante à tomografia computadorizada nos seres humanos. As descobertas sugeriram a existência de uma zona de baixa resistência elétrica, muito abaixo da superfície, "que provavelmente consiste em uma câmara magmática".
Geofísicos da Universidade do Alasca notam uma região em que as ondas sonoras viajam mais lentamente que o normal, característica de rochas parcialmente derretidas. Noah J. Finnegan, geomorfólogo da Universidade da Califórnia, campus de Santa Cruz, concluiu que a câmara magmática está aumentando 1 metro cúbico a cada segundo, embora não se tenha conhecimento do volume total.
O Uturuncu está incrustado em uma das maiores regiões de supervulcões do planeta, que possui seis supervulcões na área que abrange Bolívia, Chile e Argentina. Por muito tempo acreditou-se que ele estivesse dissociado desses supervulcões, mas as novas descobertas do projeto revelam que o magma da última erupção do Uturuncu se assemelha mais ao magma dos supervulcões que ao dos vulcões mais comuns da região.
Para Mayel Sunagua, geólogo do governo boliviano e membro da equipe do projeto, trata-se de um momento empolgante, "o primeiro esforço internacional amplo dedicado a investigar nossos vulcões". A Bolívia possui 198 vulcões reconhecidos, sendo que 18 deles são considerados potencialmente ativos. A última erupção vulcânica ocorreu há 10 mil anos.
Essa agitação leva algumas pessoas a refletir: Por que focar um perigo potencial, possivelmente 10 mil anos à frente, quando outros perigos relacionados a vulcões são muito mais iminentes?
"Eu me faço essa mesma pergunta", reconheceu Unsworth. Contudo, ele mencionou ainda que a pesquisa ampliaria o conhecimento dos cientistas sobre os vulcões em geral.
De Silva concorda com ele. Com sua crescimento estranho e outros sinais pouco comuns, o Uturuncu possui um interessante ar de mistério, afirmou, além de "ser um tanto divertido".
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